O festival que afinal só existiu nas redes sociais

Não deixa de ser irónico um dos assuntos do momento nas redes sociais ser um promissor festival que nasceu, cresceu e morreu na internet, o Fyre Festival. Uma das maiores fraudes do século que recorreu às tecnologias e aproveitou a crescente insensatez dos jovens que, cada vez mais, confiam incondicionalmente nos conselhos de figuras públicas na internet.
O (suposto) festival foi apresentado ao mundo através de um vídeo promocional de alta qualidade e, em seguida, promovido por personalidades com milhares de seguidores no Facebook e Instagram.
Este fluxo de comunicação criou um enorme buzz nas redes sociais e essa foi a principal razão para os bilhetes esgotarem em poucos dias. Os promotores anunciavam concertos incríveis e luxuosas condições numa ilha nas Bahamas. Antes do evento ter início, as pessoas que colocavam questões à organização no Twitter e Instagram, viam-nas instantaneamente apagadas, o que não era um bom presságio. A organização previa um falhanço a vários níveis, mas decidiu continuar. As agências de marketing, contratadas à distância, continuaram o seu excelente trabalho, sem perceber o que realmente se estaria a passar no terreno.
O valor extravagante do pacote completo, cerca de 10 mil euros, e do bilhete diário, que custava cerca de 500 euros, prenunciava um evento de luxo. Era prometido um jato privado, comida gourmet e alojamento de qualidade. No dia do evento, o terror começou. Não existiam voos de regresso, o jantar resumiu-se a sandes com duas fatias de queijo e o alojamento, previamente anunciado como sendo luxuoso, não passava de um conjunto de tendas enlameadas onde os participantes tiveram de improvisar os seus próprios colchões.
Fotografias e vídeos do que se estava a passar começaram a inundar a internet. O festival estava, definitivamente, arruinado. Este caso aponta para a vitória do anonimato sobre influenciadores de grande dimensão, quando o assunto é informação de qualidade e confiança.
Lado a lado com as irritantes fake news, criadas e propagadas diariamente com o objetivo de confundir os mais distraídos, este é um excelente exemplo da importância da expressão “não confies em tudo que vês na internet”. Infelizmente, já não basta educar as crianças. Parece que jovens e adultos continuam a cair nas armadilhas de entidades incompetentes e menos bem-intencionadas. No fundo, fala-se de um festival que viveu nas redes sociais e que foi destruído nas redes sociais, mas que poderia ser bem mais que isso. É importante ser-se criterioso quando o assunto passa por internet e redes sociais. Nem tudo é real, nem tudo é orgânico. Para os influenciadores, não basta aceitar as campanhas e vestir a camisola. Há que ter em conta que se a publicação for publicitária, deve ser anunciada como tal, caso contrário, há um nível de responsabilidade associado. Quem é que merece mea-culpa neste caso? As figuras públicas que promoveram massivamente este festival sem conhecer o produto ou as pessoas que deixaram de pensar com a sua cabeça e começaram a pensar através de um ecrã? Os likes não são tudo…